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14 de Fevereiro de 2019

A “lei Anticrime” e Seus Reflexos no Direito Penal Econômico

Por Marcos V. D. Carrasco[1]
 

No 4º dia do mês de fevereiro de 2019, o novo Ministro da Justiça apresentou o projeto de lei que elaborou com o escopo de alterar quatorze diplomas normativos (dentre os quais se destacam: o Código Penal, o Código de Processo Penal, a Lei de Execução Penal, a Lei de Prisão Temporária e a Lei de Crimes Hediondos) e de munir o poder público de ferramentas mais eficazes para, em tese, combater infrações penais de forma mais efetiva, reduzindo, assim, a sensação de impunidade que assola o meio social.
Entre os vários dispositivos que cria e modifica, o aludido projeto institui regras que recrudescem o tratamento que é dispensado à quem pratica crimes com o emprego de violência ou grave ameaça (como homicídio, latrocínio, estupro, etc.), exasperando sanções e agravando o regime de cumprimento das penas, mas também busca sepultar diversas discussões que indubitavelmente repercutem sobre o campo do direito penal econômico.
Dentre elas, destacam-se as controvérsias concernentes à (im)possibilidade de as penas privativas de liberdade e restritivas de direito serem executadas após a prolação de acórdãos condenatórios unânimes, proferidos por tribunais (independentemente de trânsito em julgado); e a possibilidade de o magistrado iniciar, de ofício ou a requerimento do interessado ou do Ministério Público, o processo de avaliação e venda de bens que, porventura, tenham sido atingidos pelas medidas cautelares de arresto, sequestro ou hipoteca legal (isso sem falar na ampliação das hipóteses de interrupção e no aumento do prazo prescricional).
Isto significa, por exemplo, que na hipótese de o aludido projeto vingar, o empresário que vier a ser condenado “por não ter apresentado, à autoridade fazendária, os comprovantes de crédito de ICMS” ou “por ter deixado de recolher ICMS cuja existência tenha sido adequadamente declarada”, poderá, não só, ser compelido a iniciar o cumprimento de sua pena antes do derradeiro exame de recursos que visam discutir afrontas à Constituição Federal (como ocorre no caso de Recurso Extraordinário) ou  ilegalidades e divergências de entendimentos adotados pela jurisprudência em relação à aplicação de lei federal (como ocorre com o Recurso Especial), como também poderá ser expropriado de seus bens pessoais (em virtude de obrigações tributárias de suas empresas), sem que, sequer, sejam realizadas quaisquer discussões a respeito dos requisitos autorizadores da desconsideração da personalidade da pessoa jurídica.
E se há o discurso de que tais recursos, por vezes, são utilizados como instrumentos de procrastinação processual, há de se memorar que, há alguns anos, vários empresários foram criminalmente responsabilizados pelo “inadimplemento de tributos decorrentes da inclusão de ICMS na base de cálculo de PIS e COFINS” que, mais tarde, foram considerados indevidos, pelo STF, no julgamento de um recurso extraordinário.
É certo que o direito penal foi concebido para funcionar como a derradeira trincheira de proteção do ordenamento jurídico, mas a cada dia que passa, o que se percebe é que o legislador tem retirado deste ramo do direito a sua função precípua de combater o crime e preservar a paz social, para convertê-lo em um “instrumento de protesto” (da União e dos Estados) dos mais efetivos; instrumento este que, para estimular o pagamento de débitos não pagos, acaba levando os operadores do direito que atuam neste ramo (como autoridades policiais e magistrados criminais) a intensificarem a sua (já assoberbada) rotina de trabalhos e a colocarem em segundo plano o real interesse da população, que consiste na elucidação de crimes e não na cobrança de débitos que, com certeza, poderia ser realizada de forma efetiva na esfera cível.
 

[1] Advogado e Sócio responsável pela área de Direito Penal Empresarial do Escritório Frizzo e Feriato; Especialista em Direito Aplicado pela Escola de Magistratura do Paraná; Bacharel em Direito pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná; Professor de Direito no curso preparatório para OAB do Delta Jus; Professor de Direito do Centro Universitário UNIVEL; Membro Fundador da APAC de Cascavel – PR; Professor de Direito no Focus Concursos.

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